Chegou a hora da linguagem simples na nossa vida?
E principalmente, no serviço público.
Durante uma das discussões que participei este ano, havia um dispositivo que dizia que a vigência de um prazo estava adstrita a uma situação.
Estava muito empolgado após assistir uma palestra sobre linguagem simples1, eis que eu consegui emplacar a mudança de termo. Sai o adstrita e entra condicionada.
Quando comentei essa passagem com a Josiane Dalmagro, do InovaJus do TJMT, ela me retrucou mais ou menos assim: E todo mundo vai entender esse termo? É possível ficar ainda mais simples e acessível?
Meu mundo caiu após a constatação de que era possível ir além. Há um caminho longo para que a comunicação seja plena para todos os brasileiros.
A linguagem simples pode ser considerada o conjunto de técnicas para transmitir informações de maneira clara e objetiva, permitindo ao leitor encontrar facilmente o que procura, compreender o que encontrou e usar a informação. Para isso devem ser usadas palavras, estrutura e leiaute da mensagem que facilitem essa obtenção de informação.
Quando o assunto é linguagem simples, o que sempre me vem a cabeça é uma intimação judicial, como esse exemplo que vi pela internet:
No começo de dezembro, o Conselho Nacional de Justiça lançou o Pacto Nacional do Judiciário pela Linguagem Simples, com o objetivo de adotar linguagem simples, direta e compreensível a todos os cidadãos na produção das decisões judiciais e na comunicação geral com a sociedade (mais detalhes aqui).
Uma Política Nacional
Também na primeira semana de dezembro, a Câmara Federal aprovou a Política Nacional de Linguagem Simples, que segue agora para o Senado.
No texto, há o comando para que administração pública obedeça o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp), mas também utilize algumas técnicas previstas em um rol exemplificativo:
Redigir as frases em ordem direta, preferencialmente em voz ativa e em frases curtas.
Evitar frases intercaladas, uso de substantivos no lugar de verbos, redundâncias, estrangeirismos que não sejam de uso corrente e palavras imprecisas ou desnecessárias.
Desenvolver uma ideia por parágrafo.
Usar palavras comuns, que as pessoas entendam com facilidade, e também empregar sinônimos de termos técnicos e de jargões ou explicá-los no próprio texto.
Não usar termos pejorativos.
Redigir o nome completo antes das siglas.
Organizar o texto de forma esquemática quando couber, com o uso de listas, tabelas e gráficos.
Organizar o texto para que as informações mais importantes apareçam primeiro.
Usar linguagem adequada às necessidades da pessoa com deficiência, observados os requisitos de acessibilidade previstos na Lei nº 13.146/2015 - Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Testar com o público-alvo se as mensagens estão compreensíveis (penso que essa prática é chave, se você mostra um texto para outra pessoa e ela não entende de primeira, trata-se um sinal claro que a mensagem pode ser transmitida de uma outra forma, mais simples).
O interessante é que algumas dessas sugestões já estão na Lei que disciplina as técnicas de Elaboração, Redação, Alteração e Consolidação das Leis.
Por um Legislativo mais simples
O poder legislativo tem uma verdadeira avenida para melhorar, não só escrevendo leis mais simples, mas também na construção de sua própria terminologia.
O ano legislativo chama-se sessão legislativa (o termo está até na Constituição), mas sempre há aquela dúvida com a sessão plenária. Se há confusão até em quem é do ramo, imagina para o cidadão comum?
Outro exemplo é a questão das leis alteradoras, o que é um agravante para o entendimento simples da legislação. Por um lado, há uma questão técnica para construir a alteração que tenha um encaixe jurídico pode se opor a um texto mais claro.
Talvez um resumo, como uma nova parte de todas as normas, pudesse ajudar a resolver os conflitos entre técnica legislativa. Isso, inclusive, pode surgir em uma convenção internacional sobre legística2.
O consultor do senado João Trindade apontou que para a comunidade de países lusófonos causa estranheza que nossas leis ainda utilizem algarismos romanos.
A lei que disciplina a redação legislativa em 1998 já estabeleceu que as leis precisam ser claras, precisas e possuir ordem lógica.
Além de tudo o que está acontecendo nacionalmente no tema de linguagem simples, quero destacar duas iniciativas aqui de Mato Grosso: A Política Estadual de Linguagem Simples e de Direito Visual3 e o Manual de Linguagem Clara e Direito Visual do TJMT.
Uma honra: Participei de uma edição do podcast Legis-Ativo
Dezembro me reservou uma grande alegria, no último dia 8, participei do podcast Legis-Ativo, com dois grandes nomes da Ciência Política nacional, Graziella Testa e Humberto Dantas (que sempre aparecem por aqui). O podcast está no youtube e no spotify.
Fui para falar sobre Impeachment nas Assembleias Legislativas no contexto do projeto de lei que visa substituir a nossa lei atual, que é da década de 50 (escrevi um texto sobre isso, contextualizando o instituto e até sugerindo uma redação alternativa4).
O convite se estendeu até o final do programa e acabei falando sobre outros assuntos (inclusive sobre o tema dessa edição).
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E por falar em Humberto Dantas, ele escreveu um texto muito pertinente: Cientista político precisa ouvir quem FAZ a eleição na ponta.
Caderno do ILP - Ensino - Pesquisa - Extensão Cultural: Inteligência Artificial e Regulação Estatal.
O quê a IA nos ensina a escrever melhor. Via
.O podcast Sem Precedentes, do Jota, fez uma análise muito interessante sobre a PEC das Liminares do Supremo.
Imposturas e incompreensões sobre o regimento interno das casas legislativas, pela dra. Roberta Simões. E também vale essa postagem sobre exigência de dois turnos de votação por Leis Orgânicas.
No dia 04/12, a foto abaixo e um fato sinistro que aconteceu no plenário do senado completaram 60 anos. Para saber mais, indico o podcast Collor versus Collor, da .
Política em filtro, podcast da Baselab.
A IA que vai dominar o mundo já está entre nós, via
.Revista Parlamento e Sociedade n. 21. Já fiquei curioso sobre o texto que fala do impacto político das consultoras da Natura.
NY quer processar a Pepsi por conta do plástico, oriundo de produtos da empresa, que acabam nos rios. Via
.Uma imagem diferente:
"A ignorância é uma bênção” (falo muito isso) e outras duas coisas que entendemos errado em um xwitter da Rosana Hermann.
No Nexo: Quem pode e quem não pode frequentar gabinetes oficiais.
Vizinhança
Quinze por Dia, ou simplesmente QPD, é uma newsletter quinzenal com histórias, pensamentos e indicações sobre temas ligados ao Poder Legislativo, política e afins, por Gabriel Lucas Scardini Barros. Estou à disposição para conversar no Instagram @gabriel_lucas. Caso tenha recebido esse e-mail de alguém ou chegou pelo navegador, siga esse link para assinar.
Foi a fala da Mariana Zonari no E-LAB 65/66. Se eu fosse você assistiria também, há vários cases legais de aplicação de linguagem simples.
Legística é a técnica de se fazer leis.
Baseada na iniciativa cearense.
Se você quiser saber sobre impeachments, leia a monografia de Arthur Augusto Rotta, um grande trabalho.
Excelente, Gabriel! Como eu estou feliz por saber de todos esses movimentos e projetos que estão acontecendo para simplificar a linguagem jurídica! Eu adorei! Obrigada por mais esse tanto de conhecimento compartilhado. Abraços.
obrigada pela menção <3