A iniciativa popular não serve para nada!
Não leve a mal. A participação popular no processo legislativo e na política em geral é muito bem-vinda e deve ser estimulada como forma de tornar a democracia participativa uma realidade.
No entanto, a iniciativa popular para apresentação de leis, prevista na Constituição Federal, instituto que foi reproduzido nas Constituições Estaduais e nas Leis Orgânicas dos Municípios1, é uma experiência de mais de trinta anos que não deu certo.
Um projeto de lei federal de iniciativa popular precisa de cerca de 15 mil assinaturas, distribuídas por pelo menos cinco estados.
Um esforço hercúleo, principalmente, quando esse mesmo projeto pode ser apresentado por apenas um deputado ou senador2.
Há alguns anos, uma série de aplicativos para celular tentou facilitar a coleta de assinaturas, mas essa prática não decolou.
A única que deu certo?
Quando se fala de iniciativa popular, as pessoas lembram da Lei da Ficha Limpa ou da Lei Daniella Perez, mas essas e outras normas acabaram sendo patrocinadas por parlamentares.
Elas não são leis de iniciativa popular "puro-sangue", com a devida verificação das assinaturas, por exemplo.
A única lei considerada de iniciativa popular em nosso ordenamento federal é a Lei da Moradia Popular, que tramitou por 13 anos no Congresso Nacional.
Por ocasião de uma iniciativa conhecida como “10 medidas contra corrupção”, patrocinada pelo Ministério Público Federal, o Supremo Tribunal Federal determinou que o projeto de iniciativa popular aprovado pela Câmara tivesse sua tramitação refeita após a conferência das assinaturas. A proposta já estava no Senado e teve que retornar.
O que dá para melhorar?
Além da implementação de medidas para acelerar a coleta de assinaturas, também são discutidas possíveis ações para melhorar as poucas propostas que avançam.
Uma dessas medidas é limitar, de alguma forma, a emenda nas propostas. A já mencionada proposta das "10 Medidas Contra a Corrupção" foi totalmente desconfigurada na Câmara, com a aprovação de apenas 4 das 10 medidas e a inclusão de temas polêmicos.
Já, em sua participação do Programa Roda Viva de 30 de setembro de 2024, a ministra Cármen Lúcia cita a ideia de que eventuais mudanças de leis de iniciativa popular só possam ser alteradas mediante consulta popular.
Por outro lado, alguns atalhos são mais tangíveis do que iniciativa popular. O projeto de Ideia Legislativa do Senado Federal é um exemplo disso.
Mas quem é do legislativo sabe da facilidade de convencer um parlamentar sobre a apresentação uma proposta legislativa. Um caminho muito mais célere do que qualquer outra iniciativa.
Basta identificar um parlamentar alinhado com a ideia do projeto e, se possível, já entregar um texto pronto.
Uma história para não perder a fé na iniciativa popular
Durante a constituinte de 88, houveram Emendas Populares. Além de uma exposição virtual do Senado sobre isso, há uma edição fantástica do podcast
sobre as emendas populares apresentadas pela população indígena:Vale o clique
Um podcast sobre a primeira lei de iniciativa popular de Curitiba.
Dashboard com a participação feminina nas eleições municipais de 2024.
A edição extra da QPD sobre o resultado das consultas populares em 2024.
Supremo suspende lei de Roraima que ampliou isenção de IPVA sem estimativa de impacto financeiro. Cada vez está mais próximo o dia que o impacto financeiro (e sua compensação) serão que nem a justificação nas propostas.
Na política, a política ainda importa. Mario Rosa fala sobre o os embates das redes sociais e a mídia tradicional.
Vizinhança
Quinze por Dia, ou simplesmente QPD, é uma newsletter quinzenal com histórias, pensamentos e indicações sobre temas ligados ao Poder Legislativo, política e afins, por Gabriel Lucas Scardini Barros. Estou à disposição para conversar no Instagram @gabriel_lucas. Caso tenha recebido esse e-mail de alguém ou chegou pelo navegador, siga esse link para assinar.
É interessante notar que as regras para iniciativa popular de leis não são de reprodução obrigatória e permitem algumas adaptações para a quantidade de assinaturas e de onde elas vem. Também há caso de estados que possuem iniciativa legislativa de leis complementares e até mesmo propostas de emenda à constituição.
Inclusive essa facilidade já foi abordada em outra edição da QPD.
Excelente coluna
Gabriel, adoro sua newsletter mesmo não sendo da área do direito. Quero, porém, fazer uma crítica que você pode muito bem ignorar, já que não somos conhecidos nem nada.
Sempre fico meio chateado ao ver você usando imagens geradas por IA. Tem tanto banco de imagens com fotografias e ilustrações royalty-free (como o unsplash) que você pode utilizar — arte real, de gente real — ao invés dessa ferramenta que tanto fere a comunidade artística.