Somente em 2023, foram promulgadas quatro emendas à Constituição Federal, introduzindo vários novos dispositivos à nossa Lei Maior. A última emenda foi a de número 132, a reforma tributária.
Já nos EUA, são 23 emendas em mais de 200 anos. A última emenda é de 1992.
Uma das razões para um número tão baixo de modificações é a dificuldade para aprovar as propostas. Além da aprovação no Congresso Estadunidense, há a necessidade que o novo texto seja ratificado por pelo menos 38 estados1.
Mas em um período curto, na década de 1860, três emendas foram aprovadas:
13ª: Abolição da Escravatura;
14ª: Instituiu Direito Civis, o Devido Processo Legal entre outros temas;
15ª: Garante o Direito ao Voto independente de raça, cor ou condição prévia de “servidão”.
Essas emendas surgiram dentro de um contexto chamado de Reconstrução, após a Guerra Civil entre os estados do sul e do norte. A quantidade de eleitores negros durante o período aumentou muito, principalmente nos estados do sul, que perderam a guerra2.
Os estados contra-atacaram e criaram regras para impedir o voto de todos esses novos eleitores. Houve muita violência, mas também algumas leis estaduais que procuravam impedir o voto dessa parcela da população.
A técnica usada era dificultar o voto de analfabetos, por meio de uma técnica conhecida como Lei das Sete Urnas, onde para cada carga havia uma urna diferente e os votos depositados na urna errada eram anulados.
Outra técnica utilizada, nos dias de hoje pode parecer surpreendente: o voto secreto. Ao proibir acompanhantes às cabines de votação, muitos iletrados acabavam anulando o voto.
Normas eleitorais estaduais como essas e outras, até taxa para votar foi instituída, acabaram por ser instrumento importante para não cumprir o que foi estabelecido na Constituição de lá.
Você lembra que algum filme sobre esse período da Reconstrução
E no Brasil?
A cópia de projetos de lei já é uma tradição no Brasil (e por aqui, nesta newsletter também, já fizemos até um guia sobre o tema), mas não é de hoje que existe um movimento de apresentação temática nos estados e municípios.
“Escola sem Partido” e porte de arma para CACs foram dois temas que circularam por Assembleias e Câmaras, mas já existe jurisprudência do STF declarando a inconstitucionalidade dessas normas.
Em 2024, dois temas parecem ter se tornado a bola da vez. Ainda na questão das armas, um projeto que diminui restrições ao funcionamento de clubes de tiro já virou lei em várias cidades, como, por exemplo, em Porto Alegre.
O segundo tema são as leis que procuram dificultar o aborto legal: em Goiás, há a obrigação da gestante ouvir os batimentos do feto, já em Maceió, foi estabelecido que imagens do feto devem ser mostradas.
Nos EUA, quando havia autorização de aborto pela Suprema Corte de lá, os estados criaram regras similares. Para entender um pouco mais sobre o tema do aborto legal em nosso país, indico o podcast “Caso das 10 Mil”, principalmente esse episódio aqui.
Na próxima quarta, terei a honra de participar do programa Prosa Jurídica, da Metrópole FM daqui de Cuiabá e que é apresentado pelas advogadas Angélica Angulo e Pabline Belfort. O tema será a participação do advogado no processo legislativo. Deve haver transmissão no You Tube.
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Autismo: uma guerra regulatória
Os planos de saúde afirmam que antes de mudanças regulatórias aprovadas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS em 2021, os gastos com diagnóstico e tratamento do autismo chegavam a 2% dos custos médicos das empresas, em 2023 chegam 9%, praticamente ultrapassando os gastos com oncologia (há um bom episódio do Café da Manhã sobre o tema).
Agora a representação dos planos promete reverter a situação, tanto na ANS quanto no Congresso. Um alerta para possível perda de direitos.
Mais:
Os diagnósticos de autismo estão aumentando, sim, mas o autismo, provavelmente não (em inglês, link veio pelo
).Escolas não podem negar direito à educação, via
.O Camilo Rocha compartilhou uma história muito bacana sobre um menino autista que encontrou o David Bowie.
Vale apena ouvir a participação da Andréa Werner, deputada estadual por São Paulo, no podcast Viracasacas.
Tribunais de Contas e o STF: mais um round
STF decide que Tribunais de Contas podem condenar administrativamente governadores e prefeitos.
A grande questão é se esse novo entendimento impactara a aplicação da Lei da Ficha Limpa diretamente após a decisão de um TC, ainda que não referendada por Assembleia Legislativa ou Câmara Municipal.
Isso poder ter impacto nas eleições desse ano.
Mais sobre o tema em matéria do Jota.
Vale o clique
Quem diria que a história do Mickey Mouse seria também uma história legislativa: quando o Mickey virou domínio público no Brasil e o quanto a Disney já faturou com obras que estavam em domínio público (em inglês).
A série de entrevistas do podcast Resumido está muito boa, para começar indico essa com o Paulo Rená.
Já praticou o amor hoje? Laura Capelhuchnik fala sobre amor político.
Campanha eleitoral e o fim da era dos supermarqueteiros, pela Gisele Meter.
Este homem é meu irmão, uma maneira de enfrentar a calcificação política (o termo da moda, popularizado pelo livro Biografia do Abismo).
Momento MT: Duas substackers daqui de Cuiabá (apesar de uma estar na Itália):
da e da .Linguagem Simples é clareza, objetividade e elegância, por Patricia Roedel (grifo meu).
Autoria e retirada de assinatura em propostas de iniciativa coletiva no Legislativo. O texto de Davi Rocha Teles é um bom começo de discussão.
Cidade de 7.315 habitantes recebeu mais emendas que Salvador.
Os regimentos internos atualizados dos Tribunais brasileiros. Alguém topa fazer isso para as Casas Legislativas?
Scott Galloway fez suas previsões para 2024. Praticamente o único que cravou uma vitória do Biden (por conta da economia). Acompanho o Galloway graças ao
.Barriga de Aluguel (Surrogacy) e o Mercado de Reprodução Assistida: chegou a hora de regular? Por Vanessa Vilela Berbel. Ano passado tangenciamos o tema.
Vizinhança
Quinze por Dia, ou simplesmente QPD, é uma newsletter quinzenal com histórias, pensamentos e indicações sobre temas ligados ao Poder Legislativo, política e afins, por Gabriel Lucas Scardini Barros. Estou à disposição para conversar no Instagram @gabriel_lucas. Caso tenha recebido esse e-mail de alguém ou chegou pelo navegador, siga esse link para assinar.
Mais exatamente, três quartos das legislaturas estaduais.
Soube dessa história no livro Como salvar a democracia, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, e agora estou fascinado pelo tema.
Obrigada por me indicar aqui na sua news Gabriel! Fiquei super feliz!
O finado professor Carlão , de Constitucional, da UFMT, costumava chamar nossa Constituição de almanaque, já que a cada ano tem-se que comprar uma mais recente para estarmos atualizados na profissão.
Muito interessante esta 'matéria'.