A regra do jogo foi definida, e agora?
Alguns pensamentos sobre a estratégia para disputa de 2022.
Primeiro foi o voto impresso que foi apreciado e rejeitado pelo Congresso Nacional. Depois foi o distritão que ficou pelo caminho, o que na prática seria uma votação majoritária para os cargos de vereador e de deputado, tanto federal quanto estadual. A federação partidária1 foi aprovada, o projeto recebeu veto presidencial e o veto foi derrubado em sessão conjunta das casas do Congresso Nacional.
Outubro chegou e a regra foi definida. E pela primeira vez, as eleições estaduais e federais acontecerão sem a existência de coligações, o que pode acentuar alguns fenômenos, um deles é a cauda longa2.
Da música para a política
Cauda Longa é nome que se dá a um gráfico estatístico, usado para identificar distribuições de dados como a curva de Pareto, onde o volume de dados é classificado de forma decrescente. Quando comparada a uma distribuição normal, ou Gaussiana, a cauda longa apresenta uma quantidade muito maior de dados ao longo da cauda.
A cauda longa surge nas ideias de Chris Anderson em um artigo na revista Wired em outubro de 2004 (e depois em um livro), no qual ele mencionou a Amazon.com, a Apple e o Netflix (que na época era uma locadora de DVDs) como exemplos de empresas que aplicam esta estratégia. A chave era a transição de um mercado de massa para o mercado de nicho.
Muita gente aplicou esse conceito no entretenimento. A música, por exemplo, ficou cada vez mais restrita em bolhas, quando um artista pode ser gigante para seu público especifico, mas totalmente desconhecido para o resto da população. Isso acontece do sertanejo ao rock, passando pela música eletrônica ao K-pop.
Nas eleições, basicamente, a ideia é que os parlamentares mais votados recebem menos votos do que em outros pleitos e a quantidade de votos totais fica pulverizada entre os outros candidatos, o que possibilita que uma maior pluralidade nos parlamentos, por meio das ascensão de alguns candidatos nichados.
Os nichos podem ser vários, desde partidos menos expressivos que consigam organizar uma chapa capaz de organizar uma candidatura que entre nas sobras3, mas também favorece candidatos representantes de setores da sociedade, como sindicatos ou pautas mais específicas.
Para verificar a existência do fenômeno da cauda longa em alguma casa legislativa, é interessante tentar criar a uma curva de votação entre os mais votados em uma série histórica e também a curva dos menos votados de uma série histórica. A quantidade de votos somados destes deve diminuir a cada eleição.
O caminho do Superstar
Mas a cauda longa não é algo inexorável, tanto na música quanto nas eleições.
O economista Alan B. Krueger, em seu livro Rockonomics: A Backstage Tour of What the Music Industry Can Teach Us about Economics and Life, faz uma análise econômica do showbiz, e em um dos seus capítulos ele apresenta o Superstar Market.
Esse mercado de superestrelas é a situação em que um participante tem muita exposição e incentivos que se retroalimentam em um circulo virtuoso.
Krueger diz que o mercado de shows estadunidense é assim, os grandes estão ficando maiores, aumentando muito a desigualdade entre bandas e músicos, sem haver tanto espaço pros nichos.
Particularmente, não vejo isso acontecer no mercado musical nacional, quando nas redes sociais, sempre via amigos em shows lotados de artistas que desconheço dos mais variados seguimentos4.
Mas não descarto que essa hipótese se aplique a algumas eleições legislativas. Inclusive a campanha de um mercado de superestrela pode ter um risco oculto.
O equilíbrio entre o nicho e o estrelato
Se esse campeão de votos não tiver ele próprio a votação para conquistar sozinho em uma cadeira, seja pelo quociente eleitoral ou pelas sobras, seus companheiros de chapa possivelmente ficarão desmotivados.
Sendo assim, a perspectiva de uma vaga a mais na chapa é o que anima e cria a possibilidade de vitória entre os candidatos que a compõe.
A busca por esse ponto de equilíbrio é chave do sucesso para as eleições proporcionais do ano que vem (e dos outros anos também).
Falei pela primeira vez da cauda longa nas eleições foi em um episódio do Ato:
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Mano Brown x Fernando Holiday
Desde sua estreia há algumas semanas, o podcast do Mano a Mano tem sido um programa interessante. Mas na última semana, a conversa subiu um degrau.
Mano Brown recebeu o vereador pelo município de São Paulo, Fernando Holiday, filiado ao partido Novo e ex-membro do MBL.
Uma conversa interessante e respeitosa quando os dois discordam de muitos assuntos, mas constroem pontes.
Um detalhe interessante, confesso que não sabia que Fernando assumiu o “sobrenome” Holiday em homenagem à Billie Holiday. E isso é a deixa para lembrar da antológica interpretação de Strange Fruit, uma das canções mais importantes do século passado:
Outra dica boa é o livro Racionais Mc’: Sobrevivendo no inferno, escrito Arthur Dantas Rocha e parte da coleção “o Livro do Disco”, traça uma avaliação musical e social da obra prima dos Racionais.
Aproveite e também veja as primeiras duas edições:
Enfim, Quinze por Dia: a exposição de motivos da newsletter.
A pegadinha da empatia: um papo sobre como até empatia em excesso poder ser um problema.
A placa do elevador: da onipresente plaquinha ao universo dos nudges.
E mais…
Com nome de episódio como “eu sei o que vocês fizeram no verão passado”, o podcast produzido pelo Senado Federal, Legislativo - que poder é esse?, apresenta uma séries de princípios do processo legislativo. Com Fernanda Nardelli e com o professor e consultor do Senado João Trindade Cavalcante Filho.
No derradeiro dia de setembro, foi publicado o Ranking de Competitividade dos Estados.
Gostei muito dos apontamentos do podcast Sinergia, o programa reproduzido abaixo, que teve a participação de Marcelo Araujo (Chefe de Gabinete de deputado federal Evair Vieira de Melo) e apresentação de Túlio Carvalho, fala sobre a necessidade de integração de que os profissionais de relações governamentais se integrem não só com o parlamentar, mas também com suas assessorias.
Com recurso à economia, à ciência política e à psicologia, pretende-se discutir a estrutura e os modelos mais eficientes de regência da demanda judicial, da defesa, da autocomposição, dos recursos, das despesas processuais, das provas e da função decisória, disse o ministro ministro Luiz Fux, em seu voto para alterar a Resolução CNJ 75/2009, que dispõe sobre os concursos públicos para ingresso na carreira da magistratura em todos os ramos do Poder Judiciário nacional. Entre o rol de novas matérias estão análise econômica do Direito e economia comportamental (penso ser fantástico isso dai). Vi no Conjur, em matéria com a opinião de vários juristas.
O professor e consultor do Senado Luis Fernando Pires Machado tem feito uma série de apontamentos sobre questões regimentais em seu Instagram, tem muitos posts legais como esse daqui, que fala sobre a questão do impedimento (ou não) de parlamentares para votarem em certos projetos.
Ranking de comportamento parlamentar sobre as mudanças climáticas, produzido pelo Observatório Legislativo Brasileiro.
Podcast sobre reforma política, uma parceria do Centro de Liderança Pública (CLP), do Movimento Transparência Partidária e do blog Legis-Ativo:
Lembra das polêmicas sobre tomadas? A próxima discussão é sobre carregador de celular, a União Europeia apresentou proposta legislativa para uniformizar os cabos de energia para celular. Vi no Meio.
A Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul lançou uma versão comentada da Constituição Estadual, sem dúvida um trabalho interessante.
Quinze por Dia, ou simplesmente QPD, é uma newsletter quinzenal com temas sobre processo legislativo, política e afins, por Gabriel Lucas Scardini Barros. Se você recebeu esse e-mail de alguém, siga esse link para assinar.
A federação partidária é uma união partidária de longo prazo, não apenas durante as eleições, mas também por durante todo o mandato. Resta saber como os partidos irão trabalhar nesse novo contexto.
Outra questão interessante é a fragmentação partidária, muito bem exposta no texto FIM DAS COLIGAÇÕES PROPORCIONAIS: o que 2020 diz sobre fragmentação partidária, candidaturas ao Poder Executivo e perspectivas para 2022?, de Clay Souza e Teles, consultor legislativo do Senado Federal.
A sobra eleitoral é aquela vaga conquistada após serem verificadas as vagas atingidas por meio do quociente eleitoral (total votos divido pelo número de vagas).
Meu amigo Jules Ignácio apontou com razão de que na última edição do QPD eu havia conseguido me desviar do viés de confirmação e falhei miseravelmente nessa daqui.